De que vale os versos e a melancolia?
Novembro 07, 2016
O pavor de existir sem ter existido
O ser vencido pelo medo em batalha
O removermos o ser para sobrevivermos
Como cisnes se esgueirando dos olhos do mundo;
O molhar de lábios, que desconhecemos
Ser veneno na falta das exactas palavras
O misturar dos gestos, a cobardia
Nos rostos mudos nas ruas de cinza.
O cansaço imediato nas manhãs de Outono
O langor do violino nas horas prateadas
O céu recorrente, igual, imperecível
Assim os deuses troçam e riem dos homens
O azul da batina ou avental das nuvens
A noite que nos aguarda, negra de fuligem
De irremediável pranto, da solitária viúva
De uma Lua triste, que se ergue divina
O rosto da miséria que nos dói olhar
De frente, que nos lembra a Morte, o túmulo
De dias desperdiçados a sorrir sem querer
Nos voos em espirais da imaginação.
Uma gota de tinta derramada, lenta
Essa noite que se aproxima e nos reclama o fim,
O sonho amordaçado, o carregado cenho
Da vontade urgente de reanimar a infância.
O ruído líquido dos carros quando passam,
O ruído grotesco das fábricas que não param,
A bailado leve e suave das cortinas
Nos dias de cristais quebrados no silêncio.
Rolarão as horas, os dias, os meses
Os anos vindouros serão de maior culpa
E tudo é um mistério de tentáculos e abismos
De que vale os versos e a melancolia?